Alguém já disse...

Os do mal começam a vencer quando os do bem cruzam os braços!

sexta-feira, 13 de agosto de 2021

Blindados, voto escrito e o Estado Democrático de Direito


E a semana começou com a polêmica do desfile de tropas da marinha brasileira na explanada dos ministérios no Distrito Federal objetivando entregar ao presidente da República um convite para participar de uma atividade militar. Boa parte da altercação envolvendo a para militar foi o fato de que tal mobilização, que até onde se sabe ocorre todos os anos, ocorreu na véspera de a Câmara dos Deputados votar a proposta de Emenda Constitucional para implantar o voto impresso defendida pelo presidente Messias. Claro que contribuiu muito para dar nuances de arrelia ao acontecimento a postura beligerante do nosso mandatário-mor que não se cansa de promover acusações levianas e infundadas contra o sistema eleitoral brasileiro e agressões gratuitas aos membros do TSE e do STF. A falta de senso de autoridade, e de respeito, que caracteriza nosso presidente chegou ao ápice, ao menos na minha humilde leitura dos fatos, quando o mesmo referiu-se a um dos membros do STF com palavras de calão, chamando-o de éfedepe. Da mesma forma ele se dirige aos membros de oposição no Legislativo, sempre com desdém, ameaças veladas, subentendimento de uso da força, etc.

Ora, quando o representante do Poder Executivo vê a atuação constitucional do Legislativo e do Judiciário como ameaça, perseguição pessoal e conluio para prejudicá-lo, é por que o senso de competência, de responsabilidade e de compromisso com a democracia e o Estado de Direito estão muito comprometidos.

Com relação à questão envolvendo o voto eletrônico e a confiabilidade em sua lisura, penso que é uma situação ainda a ser bastante esclarecida, pois quanto mais provas nesse sentido, melhor. Mas daí a se fazer acusações medíocres sobre a honestidade do processo eleitoral brasileiro é uma distância abissal.

As pessoas perguntam por que eu confio no voto eletrônico, se eu não tenho como confirmar que ele registrou o voto que dei de fato na urna? Ora, como resposta eu digo que confio na urna eletrônica por que confio no TSE – Tribunal Superior Eleitoral, e confio no TSE pelo mesmo motivo que confio que um presidente da República ao ser eleito, por mais incompetente, ignorante, irascível e reacionário que seja, tem todo direito de governar dentro das regras democráticas até o término de seu mandato. A não ser que cometa crime de responsabilidade, claro, o que se aplica a todo e qualquer agente público.

Confio no TSE na mesma proporção que confio nas demais instituições que caracterizam o Estado Democrático de Direito: no Judiciário, no Legislativo, no Executivo, no Ministério Público, no Tribunal de Contas, nas Escolas, nas políticas públicas de saúde, inclusive nos programas de vacinação, na polícia, etc. Por serem órgãos compostos por pessoas, são falíveis, óbvio, passíveis de se desvirtuarem de ações corretas e honestas, o que só reforça a necessidade de se confiar que as responsabilidades por ações e omissões delituosas serão devidamente apuradas e responsabilizadas pelos órgão competentes. STF e TSE são falhos? Com certeza são, como o são todas as instituições que citei acima, mas é muito pior sem eles do que com eles, pois acredito honestamente que mais acertem do que errem.

Nossa democracia moderna é relativamente recente, visto que há pouco mais de trinta anos vivíamos sob uma ditadura. Ditadura militar, destaca-se. Então, retrocessos como o que estamos vivenciando no atual governo federal, que não esconde sua vontade centralizadora e sua contrariedade com o jogo político, bem como com as demais instituições que caracterizam o Estado Democrático de Direito, fazem parte do processo de amadurecimento da mesma. Para quem tem aspirações autocráticas como nosso presidente o jogo político, a oposição e a imprensa, entre tantos outros, são sinônimos de inimigos e agressores. O ômi toma como resistência e oposição pessoal o que no fundo é institucional e parte do processo democrático.


Daí me perguntam se eu acredito que possa haver um golpe militar no Brasil nesse momento. Penso que se dependesse do presidente, de alguns poucos asseclas, de algumas viúvas da ditadura, e de uma parte do povo brasileiro que viu o período de exceção por um ângulo relativamente positivo, até poderia sim. Mas numa análise mais ampla, crítica e contextualizada do momento histórico brasileiro acredito que seja difícil se materializar. As justificativas se lhes apresento em outro momento, visto que o assunto não se esgota, ok?

Então, a negativa da Câmara em aprovar o voto impresso proposto pelo presidente mostra que, ao menos neste caso, aquela Casa Legislativa está cumprindo de forma satisfatória seu papel de fiscal do Executivo, mandando-lhe o seguinte recado: “mantenha-se na linha, pois nosso apoio não será incondicional, ainda mais diante de tuas iniciativas tresloucadas baseadas em teorias conspiratórias infundadas que agridem o bom senso, a lei e a ordem”.

            Como a rusga entre o ômi e a oposição está tomando ares de retaliação recíproca, ouve-se boatos de que a CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito da Vacina quer indiciá-lo por charlatanismo, curandeirismo e propaganda enganosa em face da defesa do uso de medicamentos sem eficácia científica comprovada. Se isso ocorrer, o processo de impeachment é o desdobramento natural das acusações. Não sei se chega a tanto. Não sei se todas as cartas foram postas na mesa e todas as fichas foram jogadas. Ao menos o recado está dado. Voltaremos!