E a semana
começou com a polêmica do desfile de tropas da marinha brasileira na explanada
dos ministérios no Distrito Federal objetivando entregar ao presidente da República
um convite para participar de uma atividade militar. Boa parte da altercação envolvendo
a para militar foi o fato de que tal mobilização, que até onde se sabe ocorre
todos os anos, ocorreu na véspera de a Câmara dos Deputados votar a proposta de
Emenda Constitucional para implantar o voto impresso defendida pelo
presidente Messias. Claro que contribuiu muito para dar nuances de arrelia ao
acontecimento a postura beligerante do nosso mandatário-mor que não se cansa de
promover acusações levianas e infundadas contra o sistema eleitoral brasileiro
e agressões gratuitas aos membros do TSE e do STF. A falta de senso de
autoridade, e de respeito, que caracteriza nosso presidente chegou ao ápice, ao
menos na minha humilde leitura dos fatos, quando o mesmo referiu-se a um dos
membros do STF com palavras de calão, chamando-o de éfedepe. Da mesma forma ele
se dirige aos membros de oposição no Legislativo, sempre com desdém, ameaças
veladas, subentendimento de uso da força, etc.
Ora, quando o
representante do Poder Executivo vê a atuação constitucional do Legislativo e
do Judiciário como ameaça, perseguição pessoal e conluio para prejudicá-lo, é
por que o senso de competência, de responsabilidade e de compromisso com a
democracia e o Estado de Direito estão muito comprometidos.
Com relação à
questão envolvendo o voto eletrônico e a confiabilidade em sua lisura, penso
que é uma situação ainda a ser bastante esclarecida, pois quanto mais provas
nesse sentido, melhor. Mas daí a se fazer acusações medíocres sobre a
honestidade do processo eleitoral brasileiro é uma distância abissal.
As pessoas
perguntam por que eu confio no voto eletrônico, se eu não tenho como confirmar
que ele registrou o voto que dei de fato na urna? Ora, como resposta eu digo
que confio na urna eletrônica por que confio no TSE – Tribunal Superior
Eleitoral, e confio no TSE pelo mesmo motivo que confio que um presidente da
República ao ser eleito, por mais incompetente, ignorante, irascível e
reacionário que seja, tem todo direito de governar dentro das regras
democráticas até o término de seu mandato. A não ser que cometa crime de
responsabilidade, claro, o que se aplica a todo e qualquer agente público.
Confio no TSE
na mesma proporção que confio nas demais instituições que caracterizam o Estado
Democrático de Direito: no Judiciário, no Legislativo, no Executivo, no
Ministério Público, no Tribunal de Contas, nas Escolas, nas políticas públicas
de saúde, inclusive nos programas de vacinação, na polícia, etc. Por serem
órgãos compostos por pessoas, são falíveis, óbvio, passíveis de se desvirtuarem
de ações corretas e honestas, o que só reforça a necessidade de se confiar que as
responsabilidades por ações e omissões delituosas serão devidamente apuradas e
responsabilizadas pelos órgão competentes. STF e TSE são falhos? Com certeza
são, como o são todas as instituições que citei acima, mas é muito pior sem
eles do que com eles, pois acredito honestamente que mais acertem do que errem.
Nossa
democracia moderna é relativamente recente, visto que há pouco mais de trinta
anos vivíamos sob uma ditadura. Ditadura militar, destaca-se. Então,
retrocessos como o que estamos vivenciando no atual governo federal, que não
esconde sua vontade centralizadora e sua contrariedade com o jogo político, bem
como com as demais instituições que caracterizam o Estado Democrático de
Direito, fazem parte do processo de amadurecimento da mesma. Para quem tem
aspirações autocráticas como nosso presidente o jogo político, a oposição e a
imprensa, entre tantos outros, são sinônimos de inimigos e agressores. O ômi
toma como resistência e oposição pessoal o que no fundo é institucional e parte
do processo democrático.
Daí me
perguntam se eu acredito que possa haver um golpe militar no Brasil nesse
momento. Penso que se dependesse do presidente, de alguns poucos asseclas, de
algumas viúvas da ditadura, e de uma parte do povo brasileiro que viu o período
de exceção por um ângulo relativamente positivo, até poderia sim. Mas numa
análise mais ampla, crítica e contextualizada do momento histórico brasileiro acredito
que seja difícil se materializar. As justificativas se lhes apresento em outro
momento, visto que o assunto não se esgota, ok?
Então, a
negativa da Câmara em aprovar o voto impresso proposto pelo presidente mostra
que, ao menos neste caso, aquela Casa Legislativa está cumprindo de forma
satisfatória seu papel de fiscal do Executivo, mandando-lhe o seguinte recado:
“mantenha-se na linha, pois nosso apoio não será incondicional, ainda mais
diante de tuas iniciativas tresloucadas baseadas em teorias conspiratórias
infundadas que agridem o bom senso, a lei e a ordem”.